quinta-feira, 3 de junho de 2010

POEMAS DE SANGUE E DOR II

1 Uma mão suja a outra/
e a outra mão suja desanda no tempo/
borrando paredes e urinando a esmo/
no frio do silêncio ainda mais e mais maldito.

Uma mão suja a outra/
com tinta ou com graxa de sapato ou talvez/
as mãos que desenham o vazio desta hora/
sem piedade alguma, sem cor, sem vida e sem quase nada.

2 Quero comer um pedaço de nada/
mastigando a palavra fruta/
mastigando a palavra pão/
mastigando a palavra tédio.

Quero beber um bocado de nada/
ingerindo o substantivo veneno/
ingerindo o substantivo oceano/
ingerindo o adjetivo depressivo.

Quero comer e beber um pedaço-bocado de nada/
mastigando-ingerindo o que não mais resta do instante/
mastigando-ingerindo o correr da palavra rio/
como estas sombras que se ausentam na noite.


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