domingo, 17 de maio de 2009

FALANDO COM OS MORTOS

1 Acordo como se não fosse/
nem mesmo o mesmo de coisa alguma/
assim quando o adjetivo indiferente/
rebate as sombras que despejam este tédio no quintal.

Sobras de comida se agigantam em meus dentes/
feridos por gengivas que sangram o além de um quase-morto/
mastigo frutas apodrecidas enquanto a terra executa seus movimentos banais/
e o céu acinzentado faz de mim mais um proscrito.

2 Mortos de ocasião/
venham brindar ao fracasso/
de todos os planos e perspectivas/
no substantivo cemitério.

Os caixões estarão abertos/
e os cadáveres estarão a beber mais vinho/
inebriando o que está oculto nas horas/
que denigrem a imundície do mundo.

3
Digo adeus aos homens/
que fazem o bem e o mal/
não delibero mais nada/
inanimado no substantivo armário.

Tenho objetos à minha frente/
que nada fazem e apenas ali estão simplesmente/
e que me olham como se eu fosse este ninguém/
como algo que jamais esteve onde esteve.

4
CONTO DAS HORAS INÚTEIS - TRECHO DE UM CONTO DE JOÃO AYRES.

ele talvez não soubesse que nada era e então tentou sentir o perfume daquela tarde e viu que não poderia mais estar ali, pois era apenas uma sombra arredia na imensidão daquela lugar e então ele continuou a andar como se fosse isto que não era o que era e nem o que poderia ser e ele então resolveu parar um pouco e tomar um pouco de ar e então percebeu que também era pouco em sua existência pouca e foi minguando como qualquer coisa qualquer e então ele se confundiu com o chão que pisava e com as árvores e com as plantas e com a preposição com e foi perdendo o freio e continuou a fazer o que estava fazendo no ventre do verbo fazer e então ele continuou a andar e a fazer e a não ser mais do que isto que minguava em sua mente e ele então era isto que devia não ser e ele então era o ar, o frio, o calor, a infinidade de tons naquele canto qualquer,matéria bruta encravada na vastidão do cosmos.....

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